terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Pretensiosa Elegia

 

Fim de tarde, sentou-se na varanda e olhou a cidade.

Telhados já velhos e gastos o circundavam, antenas cobriam a paisagem e ao fundo, além do rio, via-se a área central, com seus edifícios orgulhosos.

bairro alto

O bairro era tranqüilo e simples é verdade, mas guardava dignidade e uma história. Já fora a área nobre da cidade, mas isso quando o café e a via férrea eram especiais e por suas ruas circulavam os belos senhores de terno e formosas senhoras de chapéu. Hoje não há mais brilho e status, só paredes gastas e mofadas, telhados escuros, famílias sem passado, cortiços com seus varais espalhados e jovens moças com poucas roupas. A má reputação afeta a tudo, até a beleza.

Tantas foram as vidas que por ali passaram, um cenário de tantas histórias e cores que nunca voltarão a ser vistas, incluindo algumas que a maioria evitará lembrar. Tantos medos, desejos, anseios, sonhos desfeitos, mortes em vida, tanta garganta presa com o que nunca foi dito.

Na rua abaixo três garotos jogavam bola descalços, num terreno baldio no outro quarteirão um grupo soltava pipa, pela janela da casa em frente ouvia-se duas meninas que riam e brincavam, no sobrado da esquina um casal de velhinhos conversava numa lentidão de viver. Vidas pequenas, vidas comuns... Comédias curtas e tragédias anônimas, fábulas nunca anotadas e que jamais serão conhecidas.

A vida tem esse tom paradoxal, de tanta que há a nossa volta deixamos de notá-la, de tanto que nos povoa e nos chama, deixamos de ouvi-la, de tanto que nos tortura não a sentimos em sua plenitude.

E quando a vemos, sentimos e mais a desejamos, ela está no fim...

(Texto de 09 de Setembro de 2005, uma tarde de nostalgia sem sentido, na qual a dor e prazer de viver gritam por dentro)

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